Maradona, outro tempo

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Imagino que alguém um dia disse que talvez o futebol seja mesmo um fenômeno do século XX e que sua narrativa, seu estado da arte próprio, tenha sido de certa forma abalada pelos fenômenos do modelo de mundo que vivemos hoje no que diz respeito à tecnologia da comunicação, da informação e da transmissão de jogos. Sendo grosseiro, é como se o sem número de câmeras e mapas de calor e estatísticas em tempo real e jogos transmitidos ao vivo e a cores a todo e qualquer momento sob os óculos de seus incontáveis comentaristas técnicos, táticos e até de árbitros (!) tivessem de certa forma tirado o imaginário de uma forma de expressão já autossuficiente.

Aquela uma hora e meia capaz de trazer todos os componentes de uma boa história – o drama, a tragédia, a saga do herói, a surpresa, o anticlímax, etc – carrega, por si só, o mesmo que a música, o cinema, o teatro, a literatura, enfim, possui toda a condição de alcançar o profundo na emoção humana, de chocar e incomodar a cada instante, de manter uma relação constante com quem o acompanha. Arte, oras.

Entendo que o futebol não é um espetáculo de véspera como queiram vender, pelo contrário, ele pode, e muitas, muitas vezes o é, ser algo tenso, arrastado, insosso. Também acho que a relação com o jogo remete tanto à paixão quanto às lembranças de infância, e isso ninguém acorda e lê na manchete do portal da internet.

Pra terminar o raciocínio, ainda tenho comigo que o futebol não existe para ser engolido pela televisão do café da manhã à insônia num campeonato que dura nove meses, imagina isso da Chapecoense ao Bayern de Munique, imagina que milhões de brasileiros podem assistir a três horas de jogos do Criciúma ao vivo por semana.

Enfim, enrolei pra dizer que, sem nem precisar chegar em critérios técnicos, táticos, número de gols, conquistas, títulos, atuação aqui ou ali, exame de sangue ou votação divina; sem nem precisar se alongar muito sobre o que um fez e o outro não; e, ainda mais, sem nem precisar criar uma comparação entre ambos os tempos, já que seria contraditório fazê-lo devido ao próprio argumento central desta ideia: só pela conjuntura, digamos, não é possível haver algo parecido com isso na Copa do mês que vem.

Maradona ’86, em série da ESPN, reverência a um dos maiores personagens dum outro tempo da relação entre o futebol e o resto.

https://www.youtube.com/watch?v=2yBsxCpKM9Q

 

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Paulo Silva Junior, jornalista, escreve para o blog da Central 3 semanalmente, e apresenta os programas Folha Seca e Esporte Fino dentro do site.

 

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