Textos Caribenhos

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Por Victor Faria

I

Um novo, inteligente e estranho personagem incorporou-se, meses trás, à nossa instituição. Apresentou-se num dia qualquer procedente de um conhecido país, localizado ao norte da extravagância.

Um homem intranscedente, desprevenido, que aciona o mais difícil e pitoresco mosaico de planos de jogo. A dificuldade do idioma passeava em sua voz e a fazia despencar pelos despenhadeiros mais profundos da gramática.

Sem filiação tática definida, teria fácil confundi-lo com um anarquista da bola. Mesmo sem credenciais diplomáticas, tinha a dignidade consumada de um ministro dos esportes fora de moda.

Iniciou-se no tema de sua predileção falando suavemente, cercadas por uma corrente de lirismo exagerado e pela intimidade no gracejo de primeiros nomes. Logo, quando em seu interior se desatou a tempestade oratória, falou de sua peregrinação pelo desordenado mundo do futebol, de suas campanhas nacionais e continentais, dos procedimentos de jogo brotados de uma frondosa experiência de andarilho. Seu conhecimento e atrevimento incorrigível podiam fazer estremecer de inveja a muitos de nossos conselheiros.

E agora, definitivamente incorporado ao nosso trabalho diário, deixa seu par de canetas aos cuidados do eterno assistente membro de nossa comissão técnica, talvez sem imaginar que a criatura em questão não será capaz de desenvolver o básico de suas convicções.

E será essa, a partir de hoje, nossa cotidiana dor de cabeça. Começamos a apresentar, com ele, uma maneira de jogar além de nossas pretensões. Controle de posse de bola, conhecimento sobre o time adversário e suas possíveis e identificadas fraquezas. Será preciso manter a competitividade e eliminar adjetivação de três ou quatro classificados à Copa Libertadores.

Em poucas palavras, este é, ou era, o membro mais útil de nossa agremiação. Encarregado de erradicar tudo que no gramado não se vale. E assim, nos campos do futebol, deixar perdurada a obra impublicável de todos os boleiros espontâneos.

Hoje, amigos leitores, já podem ser encontrados os motivos originais desta obra já defasada ser naturalmente uma anacrônica.

II

Não é verdade que você, frequentemente, sente-se como um protagonista de uma trama de ficção, quando a emotiva carga de todo um enredo ocupa integralmente sua capacidade de controlar-se?

Você, como qualquer homem normal, deve ter sentido, mesmo em condição anônima, de estar sendo traído ou vigiado. É o momento em que o ambiente deixa de ser um núcleo simples e se converte num universo de descontrolados sentimentos. Cada indivíduo se portará de uma maneira, de acordo com sua estrutura temperamental. Alguém, sem dúvida desmaiará. Outros acompanharão, em silêncio suspenso, o fio da trama. Cada um a saber como se portar.

Você, homem de boa fé, não pode permitir que um membro social de seu clube ponha tudo a perder, que tome liberdades com seus sentimentos e com o futuro da instituição. Mas, como homem exemplar, você edificará dentro de sua conjectura racional uma maneira de não se abalar, de se controlar a fim de buscar uma melhor solução, em prol de todos, de um bem maior. Sua dignidade decente ficará, assim, intacta e satisfeita. E eu, em nome dos homens de bem, certificaria o fato como correto.

O porém, é que nem todos pensam como você. O sr. Ataíde Gil Guerrero, por exemplo, um honrado funcionário do time, demonstrou pela manhã que, quando sua emoção se despenha sobre uma situação insuportável, converte-se num autêntico safanão. Este cidadão sentia que suas veias subiam os animais do inconformismo durante uma reunião sobre o futuro nome escolhido como novo treinador. Este enérgico cavalheiro, ao ver frustradas suas esperanças, precipitou-se contra o presidente e proferiu contra ele um soco levando-o ao chão.

Falta dizer que o impetuoso Ataíde Gil Guerrero perdeu seu cargo no clube, mas não resta dúvida de que teve o sono tranquilo dos homens que estão em paz com sua consciência.

III

Reto, empinado e magnífico caiu Carlos Miguel Aidar sob o impávido sopro da violência. A força de suas ideias, de suas convicções ideológicas desencadeara o estopim da força bruta e alheia.

Desde o instante em que sucumbia à queda começou a sentir em seu ventre as famigeradas raízes do ódio, da perseguição e da vingança. Carlos Miguel Aidar saíra do hotel já imaginando a tormenta chegada de perguntas que o aguardavam. Preferiu uma nota oficial.

No mesmo lugar onde edificara suas barricadas de justiça, onde suas palavras defenderam uma mudança de gestão, democracia, aqui, desmoronou seu corpo abatido e só. Um soco feito um apelo profético.

Em suas pálpebras começaram a crescer as violetas do espanto, porém em seu interior há uma outra violeta de chumbo que busca, em sombras perpétuas, o caminho de sua realização.

Tem a voz desatada e transfigurado o semblante. Um ar frio, gelado pelo sopro contínuo de quem caminha sozinho, golpeia com punhos metálicos seu rosto inquebrantável. Deverá agora formar uma nova diretoria, organizar uma nova legião, trazer ao clube homens que clamam por justiça, que busquem paz, concórdia e compreensão abrangente da situação, para que não se transfigure a imagem sua à da instituição.

Seu nome tem agora um sabor amargo e perpétuo bem como sua ações.

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