Depois de mais uma derrota judicial, desta vez no STJ, ficou mais próxima a prisão do ex-presidente Lula. Sua defesa aguarda uma decisão do STF, embora o ministro Fachin já tenha liberado o pedido de HC para julgamento há mais de um mês. Cármen Lúcia ainda não marcou a data de apreciação do pedido, e por isso vem sofrendo forte pressão de parlamentares petistas como a senadora Gleisi Hoffmann.
Enquanto soltam bravatas para inflamar uma base cada dia mais angustiada, Lula e seus correligionários reproduzem a imagem de Vladimir e Estragon: sentados debaixo do salgueiro-chorão do teatro absurdo de Beckett, esperam seu Godot fantasiado de uma insurreição popular que nunca veio e jamais virá.
“Se ele veio ontem e não estávamos aqui você pode ter certeza que ele não virá hoje novamente.”
A frase de Estragon para Vladimir parece ser endereçada diretamente para a base de Lula. A força popular que ontem lançava flores para os quase 90% de aprovação do presidente, já não virá novamente e, pior: agora se divide na polarização entre quem atira pedras e quem chora na beira da estrada.
A imagem é desoladora, como é desolador o cenário político do país.
Essa desolação é a fatura da política de conciliação de classes dos governos petistas. Quando escolheu governar com o PMDB, o petismo trocou sua alma pela manutenção do poder. Criou e consolidou uma governamentalidade através do qual atuou conscientemente para mobilizar e cooptar os corpos de movimentos sociais e sindicatos. O objetivo foi desmobilizar a luta política da sua base popular. E conseguiu.
Agora o boleto chegou, como fatalmente chega toda conta de bar.
O problema é que quem mais bebeu e comeu não quer recontar suas garrafas para pagar sua parte. Prefere acusar o garçom, que antes era seu amigo, de traidor, anti-petista e até de pobre de direita. Logo agora que o coitado do trabalhador virou intermitente precarizado pela reforma trabalhista dos próprios convidados de honra do convescote lulopetista.
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ESTRAGON: O que fazemos agora?
VLADIMIR: Não sei.
ESTRAGON: Vamos embora.
VLADIMIR: Não podemos.
ESTRAGON: Por que não?
VLADIMIR: Estamos esperando Godot.
*André Raboni é historiador, analista de comunicação e mídias digitais. Especialista em política e comunicação.