Por Marcelo Mendez
O ano de 1997 foi duro…
Meu pai, cansado de lutas, das coisas da vida, doente, duramente doente, lutava contra todas as suas infecções renais, suas dores, suas mazelas de mortal, que um homem da grandeza de meu velho não merecia ser. Meu pai merecia mais, muito mais…
Em uma daquelas noites de visita no Hospital Jardim em Santo André, enquanto eu me apertava numa poltrona ao lado de seu leito, o velho me chamou:
“Ei Barbudo…”
“Fala pai, que foi?!”
“Quanto foi o último jogo do Palmeiras nosso??”
“Ah se liga, pai! Dorme aí…”
“Deixa de ser tonto rapaz. Me diz; Ganhamos?”
“Pai, o senhor já tá aí tudo macumbado. Melhor deixar o Palmeiras pra lá, vai por mim…”
O Velho riu do jeito que podia e insistiu:
“Não se nega um pedido para um homem nessa minha condição. Diga quanto foi o jogo?”
“Tá bom; Foi 0×0 os dois últimos jogos. O time tá uma merda. Agora dorme!”
“Não!”
“Que?! Como assim, “não”? Dorme aí caralho, quer morrer??”
Nessa hora, meu pai fez toda a força do mundo, se levantou da cama, me pegou pelo braço e disse com a velha firmeza de sempre:
“Escuta aqui moleque; eu sou teu pai e te criei para ser feliz. Te preparei para suportar as porradas da vida sim, mas não pra se render assim feito um boi lambão pra tudo que é dureza que aparecer. Que mais você quer? Que eu meta uma faca no meu peito? Você não tá vendo meu estado? Se eu tô te perguntando pelo nosso time é porque isso me dá alegria e não importa o resultado de nada. Eu quero falar de futebol com meu filho, posso?”
“Pai…”
“Cala a boca! Promete a mim: domingo você vai lá no Palestra, vai torcer, vai gritar, vai tomar uma cerveja, vai abraçar um estranho na hora do gol e vai ser feliz…”
“Pai, deita nessa porra!!”
“Promete!!”
“Tá bom, prometo!”
Assim meu pai deitou e dormiu. Olhando pro velho torci muito pro meu Palmeiras contra o Paraná Clube uns dias depois e aí, depois do 3 a 1 quis muito contar pra ele. Corri pro hospital depois do jogo na hora da visita, mas ele não estava mais no quarto. Quando o médico chamou a mim e minha mana pra conversar, nos desenganou e nosso mundo acabou. Dois dias depois o velho morreu. Tristeza.
Enterrando o velho, depois de tudo, pensei no que fazer e saí pelo mundo.
Imediatamente lembrei-me do que havia prometido a ele e então minhas pernas me levaram naturalmente pro Palestra Itália e aí, naquele dia, contra o Grêmio, o Palmeiras venceu o por 5 a 0 e o que era no começo daquele jogo uma dor sofrida virou uma lágrima de emoção, de alegria sim.
Em 2015, sem meu pai por aqui, o Palmeiras, por hora, não dá mais aqueles espetáculos.
Oras…
Em 101 anos de história, o Palmeiras passou diversas crises. Em 1942, por motivos pífios, teve que mudar de nome. Deixa de ser Palestra campeão e nasce Palmeiras vencedor sobre o São Paulo. Na minha geração, esperei 16 anos para ver como era essa coisa de ganhar título, como o de 1993, e vos digo com certeza: Não fez a menor falta. Não amei menos, não fui menos feliz. Por tudo isso, no seu aniversário de 101 anos, Palmeiras, eu te agradeço.
Parabéns, Palmeiras. Meu Palmeiras…