“Eu juro que se não respeitar este sermão, serei morto da maneira mais brutal”.
Este juramento, pronunciado durante o rito de iniciação à ‘Ndrangheta, a máfia calabresa, atormentou Gaetano D’ Agostino ao longo de sua carreira. Contudo, o ex-jogador da Fiorentina e Udinese nunca fez esta jura à mais influente organização mafiosa dos anos 90. Grande promessa do Calcio em sua juventude, Gaetano teve que carregar por muitos anos o fardo de seu pai, Giuseppe D’Agostino, ex capo da ‘Ndrangheta na pequena cidade de Laureana di Borello. Preso em 2006, o seu pai colaborou com a justiça denunciando vários colegas do crime organizado. E na Calábria romper com o código da Omertá significa assinar uma sentença de morte por toda a vida.
O ingresso na máfia calabresa se dá somente por elo de sangue. O dia em que Giuseppe D’ Agostino decidiu, através de uma picada ritual no dedo, se engajar nas leis da ‘Ndrangheta, ele se transformou em um mais novo membro da poderosa máfia que suplantou a Cosa Nostra siciliana. Nos anos 80, o pai de Gaetano foi promovido. Apoiado por ‘Ndrina Belloco de Rosano (cada ‘ndrina, composta por membros de uma mesma família, controla o seu próprio território), Guiseppe D’Agostino era, em 1996, um dos trinta mafiosi mais procurado da Itália. Encontrou asilo em uma pequena casa em Rosano, província de Reggio Calabria, longe de seu filho Gaetano, nascido em 1982, em Palermo. Neste mesmo ano, Gaetano marcou mais de 100 gols no equipe de juniores do clube da capital siciliana.
Em 1998, Gaetano foi contratado pela Roma. Uma transferência forçada pelo pai do jogador, que considerava a capital mais segura que a Sicília. Ao lado de Francesco Totti, D’Agostino venceu o Scudetto na temporada 2000-1, entrando apenas vez em campo. Para o siciliano, a adaptação à città eterna foi difícil. Entre 2000 e 2005, o jogador, ainda no clube romano, foi emprestado ao Bari. Em seguida ele assinou um novo contrato com o Messina e retornou à sua terra natal. Na temporada seguinte, Gaetano jogou ao lado de Giuseppe Sculli, neto de Giuseppe Morabito, também capo de um clã da máfia calabresa. O avô mafioso foi preso depois de anos foragido, quando assistia a um jogo de seu neto no estádio. Foi o início dos problemas de Gaetano. Em 2006, seu pai foi preso por ter participado de mais de dez homicídios. A partir dai, o senhor Giuseppe D’ Agostino optou por colaborar com a justiça italiana, traindo o código de honra mais importante da ‘Ndrangheta: a Omertá!
A máfia que não perdoa a traição, condena os desleais e toda a sua família à pena de morte. Gaetano D’Agostino corria sério perigo e pagará para sempre pela felonia de seu pai.
O time do Messina sabia muito bem que Gaetano estava em perigo. A cada treino, o jogador era protegido por policiais. Depois de uma boa campanha na Sicília (4 gols em 27 jogos), a Udinese e seu presidente Giampaolo Pozzo, ávido por bons negócios, contratou o jogador. Ele ficaria quatro anos no norte da Itália. Durante a sua terceira temporada, Gaetano formou com Simone Pepe e Antonio Di Natale um dos trio mais temidos da velha bota. O clube de Friuli chegou até as quartas de final na Copa da UEFA, eliminado pelo Werder Bremen. Na ocasião, Gaetano chamou a atenção de grandes clubes da Europa. Juventus, Real Madrid e Villareal se interessaram pelo palermitani. Graças ao sucesso alcançado, Gaetano fora convocado por duas vezes pela Azurra de Marcello Lippi. Entretanto, os clubes abdicaram do jogador cientes da dificuldade em protege-lo de um ataque iminente da máfia. Na época, D’Agostino contou o episódio de sua possível transferência ao Real Madrid ao site da revista Panorama: “Estava quase contratado. Iria assinar um contrato de 5 anos por 2 milhões de euros anuais. Faltava apenas viajar até Madrid para assinar o contrato, porém a Udinese não concluiu o negócio. Eles queriam mais contrapartidas e o negócio acabou não vingando e Xabi Alonso acabou sendo contrato no meu lugar”.
Neste mesmo ano, a Juventus também preferiu contratar Felipe Melo ao invés de Gaetano. Em 2010, a Fiorentina assinou com Gaetano por 10 milhões de euros.
Depois de uma temporada ruim no clube viola, o jogador teve passagens pífias pelo Siena e Pescara. Na temporada passada, aos 32 anos, Gaetano atuou no fraco Benevento – time de uma pequena cidade próxima à Nápoles – pela Serie C1. Quase no termino de sua carreira desperdiçada, Gaetano ainda vive sob a pressão da máfia e a dura herança de um pai que estigmatizou seu filho e sua família. A família segunda a qual o escritor calabrês Corrado Alvaro dizia que é a força da Calábria, sua coluna vertebral, sua genialidade, seu drama e sua poesia. Gaetano D’ Agostino sabe bem disso.