Certa feita meu avô paterno estava campereando pelas coxilhas na fronteira entre Brasil e Uruguai quando um avião sobrevoou o Pampa e ele ouviu o praguejar de um gaucho que o acompanhava: Maldito pájaro de acero que ha matado el Zorzal.
O peão se referia ao acidente aéreo no Aeroporto Las Playas (atualmente Enrique Olaya Herrera), em Medellín, que completou oitenta anos na tarde de ontem. Na ocasião um trimotor Ford F-31 da companhia Servicio Aéreo Colombiano se chocou, no momento da decolagem, com outra aeronave, do mesmo modelo, da empresa Scadta.
No primeiro avião um dos passageiros era o ator, compositor e intérprete de tango Carlos Gardel, apelidado de Zorzal Criollo por conta do canto do sabiá-laranjeira, ave de hábitos noturnos tal qual os tangueros. O cantor “franco-uruguaio” naturalizado argentino, faleceu no ato ao lado dos companheiros Alfredo Le Pera e Guillermo Barbieri e outras 12 vítimas. 2 passageiros morreram dias depois enquanto 3 envolvidos sobreviveram.
A despedida da Celeste na Copa América pareceu uma homenagem ao também chamado Rey del Tango, ritmo musical marcado pela intensidade e melancolia. Os primeiros 10 minutos da peleja foram uma releitura da versão de Mano a Mano na voz do também uruguaio Julio Sosa El Varón del Tango, tamanha a pressão que os visitantes fizeram, lembrando o 2º Tempo do amistoso disputado ano passado, no Monumental David Arellano, quando os uruguaios – já sem Luis Suárez – bateram os chilenos por 2 a 1 (gols de Aléxis Sanchez, Diego Rolán e Álvaro Gonzalez). Tirando Álvaro Pereira (suspenso), Nicolás Lodeiro e Fabián Orellana (não foi convocado) todos os demais jogadores que começaram a partida na cancha do Colo Colo alinharam ontem, na noite fria de Santiago.
Contudo, os comandados de Jorge Sampaoli foram equilibrando as ações do jogo até o domínio total, que se manteve até o final da etapa inicial. Mas o volume ofensivo de La Roja esbarrou na defensa bem armada pelo Maestro Óscar Tabárez, não convertendo as chances criadas em gol.
O Chile voltou dos camaríns mais incisivo enquanto o Uruguai seguia apostando em uma bola, se segurando atrás. Porém, o instável Edinson Cavani – cujo corpo estava em Santiago, mas a cabeça permanecia em Salto – não resistiu ao toque incômodo de Gonzalo Jara – obedecendo a cartilha da copeirice – e tentou agredir o defensor revelado pelo Huachipato, sendo expulso. A situação da Celeste ficou semelhante aos primeiros versos de Yira Yira, ao ritmo do punk rock de Los Piojos: “Cuando la suerte, que es grela / Fayando y fayando y te largue parao”. Se com 11 em campo já estava difícil conter o ímpeto chileno, com 10 ficou quase impossível. Mesmo assim, o placar só foi aberto faltando 9 minutos para o final do tempo regulamentar.
Os orientales tentaram reagir no pouco tempo restante mas o árbitro Sandro Meira Ricci chi chi le le le expulsou Jorge Fucile, após o camisa 4 acertar um carrinho na bola em dívida com Sanchez em frente ao banco de reservas dos mandantes. Foi o segundo lance em que o lateral do Nacional foi punido ao acertar a bola. Por conta da atuação caseira do apitador brasileiro o mesmo foi afastado da competição, entretanto o estrago já estava feito. Não que o Chile tenha sido imerecedor da vitória, todavia a proposta de jogo do Uruguai foi atrapalhada pelos critérios do homem de preto.
A delegação uruguaia retorna a Montevideo ao som da segunda estrófe de Volver, outra parceria de sucesso entre Gardel e Le Pera: Volver, con la frente marchita / Las nieves del tiempo / Platearon mi sen / Sentir que es un soplo la vida / Que quatro años no es nada.
Hasta pronto, Muchachos!