O Guaraní, de Asunción, recebe hoje o River Plate no mítico Defensores del Chaco, em mais uma jornada copeira na cancha do bairro Sajona. Poucos estádios continente adentro têm um nome tão intimidador ao adversário quanto à casa da seleção paraguaia. Podemos citar o Cementerio de Elefantes, em Santa Fé às margens do rio Paraná, o Tierra de Campeones, em Iquique ao norte do Chile, ou mesmo a MORADA DOS QUERO-QUEROS, em Alvorada na região metropolitana de Porto Alegre. Contudo, o palco de 10 finas da Copa Libertadores foi nomeado por feitos extra-futebolísticos e guarda um passado sombrio nas suas dependências.
Voltemos à década de 1930. Um dos efeitos da crise econômica mundial, iniciada em 1929, foi a busca por novas fontes de riqueza. Dois anos após a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, foram observados choques fronteiriços entre bolivianos e paraguaios, na região conhecida como Chaco Boreal repleta de jazidas de petróleo sob o solo.
Como forma de recuperar a popularidade do seu governo, o general Daniel Salamanca declara guerra ao Paraguai em julho de 1932. As tropas bolivianas haviam sido treinadas por altos oficiais alemães – em um dos muitos laboratórios de cara à II Guerra Mundial – contudo, como a maioria dos combatentes era natural do Altiplano, não estavam acostumados com “a região inóspita, seca e arenosa, onde a resistência física contaria muito mais que a capacidade militar” nas palavras do historiador Everaldo de Oliveira Andrade.
Na revista comemorativa do centenário do The Strongest El Tigre Amado 1908-2008, editada pela publicação argentina El Gráfico, o dirigente Humberto Rojas relata a participação de jogadores aurinegros na Batalha de Cañada Cochabamba, em 1934: “Nuestros jugadores, junto a miles de jóvenes de entonces, fueron a defender a la Patria y se logró uno de los pocos triunfos en dicha guerra”.
Eduardo Galeano, por sua vez, recorda no clássico El Fútbol a Sol y Sombra a formação de um quadro solidário em meio ao conflito: “mientras Bolivia y Paraguay se aniquilaban mutuamente en la guerra del Chaco, disputando un desierto pedazo de mapa, la Cruz Roja paraguaya formó un equipo de fútbol, que jugó en varias ciudades de Argentina y Uruguay y juntó bastante dinero para atender a los heridos de ambos bandos en el campo de batalla (…) Así llegó Arsenio Erico a Buenos Aires, y en Buenos Aires se quedó”.
O maior artilheiro do futebol argentino foi homenageado com o nome de uma das tribunas do Estadio, que foi renomeado em 1972 – quadragésimo ano do começo da Guerra – como Defensores del Chaco. O mesmo não se pode dizer dos prisioneiros bolivianos que foram mantidos no então Estadio de la Liga. De acordo com o jornalista José María Troche em El Libro de Oro del Fútbol Paraguayo 1901/2011: “Cuando la Guerra, el estadio se convertió en Hospital de Sangre y en acantonamiento, de donde partían los soldados al frente. Fue también campo de concentración adonde llegaban prisioneros bolivianos, antes de ser enviados al interior del país”.
Próximo dali, no bairro Obrero, alguns destes prisioneiros foram mão de obra forçada nas obras do Estadio General Pablo Rojas, casa do Cerro Porteño mais famosa pelo apelido de La Olla, mesmo caso do Estadio Felix Capriles, em Cochabamba, do outro lado do front. Segundo o historiador Luis Verón “los prisioneros bolivianos pasaron muy mal, pasaron hambre, pasaron frío, desnudez. Allá, sin embargo, según leí, pasaron bien, pero sí han hecho algunas obras públicas.
Ao longo dos três anos da Guerra, mais de 25 mil bolivianos foram aprisionados pelas forças paraguaias contra 2,5 mil prisioneiros paraguaios, quase 10 vezes menos. Cerca de 90 mil homens caíram em combate, destes, aproximadamente, 65 mil vinham da Bolívia, que também perdeu 240 mil quilômetros quadrados do seu território.
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