Por Gil Luiz Mendes, do Baião de Dois
A notícia chegou no Loteamento São Francisco não se sabe como: “Vai dar pra ver o treino do Brasil”. E antes de um toque de pálpebras, os pirralhos largaram a bola no meio da rua, calçaram os chinelos que serviam como traves e correram para a vizinha Arena Pernambuco.
Suada da pelada na rua, a camisa azul grená estampava em amarelo o número 11 nas costas de um franzino menino que pela primeira entrava no estádio da Copa do Mundo, que tem nome de cerveja e foi feita pela aquela empresa que tem o nome falado todos os dias na televisão. Papai Noel atrasou exatos três meses. Conhecer Neymar era presente que ele tinha pedido, mas que pensava que nunca ia se realizar.
E tome cotovelada, peteleco na orelha, puxão de cabelo. Tudo para ficar mais perto do gramado. Tudo para ficar espremido na mureta. “Olha ele ali”. “Aonde? Tá de colete?” “Não, tá sem. Vai pegar na bola agora”. “Eita! Neymaaaar, Neymaaaaar, Neymaaaaarr”. E nada do jogador do Barcelona e dezenas de tatuagens olhar para as arquibancadas. “Ele tá muito longe, grita para David Luiz que ele tá mais perto”. “David Luiiiiiiiiiiiiiiiz! Aqui ó!”. “O cabelo tá em cima do ouvido”. Risadas nas cadeiras vermelhas.
O passeio estava divertido. Os caras do videogame e da televisão são reais, estavam perto daquela molecada, que viu a casa de alguns vizinhos serem derrubadas para as obras da Copa, afinal, tinha que ser feita uma avenida para chegar no estádio. Durante o Mundial o trânsito foi grande, hoje em dia de vez em quando passa um carro. Quando passa, é a hora que a pelada para, que o carro siga sua viagem.
Não demorou para a alegria dar lugar a revolta. “Por que aqueles meninos do cabelo liso estão dentro do campo? Ei, Neymar tá autografando a camisa dele. Eu também quero”. “Devem ser filhos dos gerentes da empresa que construiu isso aqui”. “Filhos da puta”.
Os histéricos gritos com o nome dos jogadores deram lugar para cânticos mais criativos. “Ah, é sete a um! Ah, é sete a um!” Acabou o treino e lá se vão todos os jogadores para o vestiário sem um único aceno para a torcida. O Brasil saiu de campo vaiado. Os três garotos deram as costas para o gramado e correram. Nem viram que William e David Luiz, talvez comovidos pela Semana Santa, se compadeceram e voltaram para assinar algumas camisas e tocar a mão dos que estavam na arquibancada. No caminho de casa, uma certeza: Neymar é mais legal no videogame..