Corinthians, Odeio Te Amar

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Por Marcelo Mendez

Dando uma volta pela vida, parei em um ponto de ônibus no final de 2012, onde escutei um sujeito dizer a outro o seguinte:

“Rapaz vou te falar; Não peço nada a Deus. Não quero dinheiro, não quero um trabalho melhor, não quero aumento de salário, não quero mulher bonita nem nada. A única coisa que peço ao divino é que o Corinthians perca amanhã para o Chelsea…

Discretamente dei um sorriso, peguei meu ônibus e me pus a pensar a respeito. Que coisa maravilhosa e maluca é essa coisa do futebol. O sujeito, independente de qualquer outra coisa da vida, acima de qualquer suspeita ou razão, em detrimento até de sua própria alegria, de seu possível bel prazer, quer porque quer a todo custo o azar de um outro clube rival. Mas a questão é essa mesmo, não é qualquer clube esse que falamos.

Corinthians.

Lembrei-me de minha relação com esse clube e de como isso tudo começou. Era o longínquo ano de 1976, quando eu era um menino. Um onírico e belo menino de 6 anos de idade, num subúrbio de sonhos. De um tempo que infelizmente não existe mais. Dado momento daquele ano lembro de meu saudoso Tio Bida, irmão de minha mãe que chegou em casa com um embrulho e me disse:

“Olha só, isso pra você jamais esquecer do ‘nosso’ Corinthians”

Achei estranho o nome, mas gostei porque era uma palavra que não fazia parte de meu tenro vocabulário, “Corinthians”, coisa pomposa! Então, ele me deu o embrulho, não sem antes recomendar:

“Não fala nada pra teu pai, hein?”

Disse isso com entonação de detetive da famigerada KGB. Via das dúvidas disse a ele que seguiria tal conselho, mais por conta do meu interesse pelo embrulho, do que por espírito de corpo de parceiros. Então abri…

Uma bola de capotão! Novinha, 32 gomos, nº5, coisa linda! Meus olhos brilharam! Imediatamente saí a correr pelo velho quintal do Parque Novo Oratório feliz da vida. Brinquei a tarde toda como o mais feliz dos homens, com uma alegria que jamais sentirei na vida. Nem me lembrei, no entanto, do compromisso firmado do segredo e então quando meu pai chegou, eu bati na bola pra o velho me devolver o passe. Ele recebeu a pelota, controlou com classe e elegância, de repente parou e viu alguma coisa que o deixou bastante irritado. Pegou a bola, segurou debaixo do braço e veio em minha direção:

“Quem te deu isso?!”

“Foi o Tio Bida!”

“E por que você aceitou?!”

“Ué, porque eu gosto de jogar bola. Me devolve ela!” – Falei com força!

“Não! Eu mesmo vou te dar uma bola, mas a bola certa! Você ta vendo esses nomes aqui escritos nela?? Tobias, Basílio, Zé Maria, Vaguinho, Romeu, Geraldão… São nomes de jogadores do Corinthians!! Meu filho, nunca mais na sua vida queira nada do Corinthians!! Deixa que eu vou te dar uma bola do PALMEIRAS!!”

“Mas eu gostei dessa!”

“Não me fala mais isso! Essa eu vou levar pro seu primo Serginho, que sei lá o porquê, gosta desse time. Aproveito e compro outra bola pra você!”

Resoluto, eu chorei. Acho que foi a primeira vez na minha vida que fiquei bravo com meu pai. Claro que na inocência de criança isso passou logo que chegou a bola do Palmeiras. Mas aí, meio que meu pai conseguiu. Me deu uma raiva danada daqueles tais nomes de jogadores do Corinthians escritos na bola. “Chatos, me tomaram meu brinquedo! Também não gosto mais deles, sou palmeirense!”– E assim começou nossa relação de rivalidade:

“Eu sou Palmeirense e não devo gostar desses caras do Corinthians”

Mas logo saquei que seria difícil…

De menino, vi a festa que eles fizeram um ano depois em 1977. Vi meu primo Serginho chorando, correndo em minha direção pra me abraçar e dizer:

“Primo, sou campeão, porra!”

E como eu fiquei feliz por ele! Fiquei, mas não contei pra ninguém! Afinal, como palestrino não pegaria bem! Aí começou a dureza de minha vida de torcedor. Enquanto meu time amargava a escassez de títulos, o tal do Corinthians era campeão ano após ano. E eu lá… torcendo contra!

Veio 1982 e a Democracia Corintiana. E o legal era ser corintiano por motivos muito maiores que o jogo de bola. O Corinthians era o time da moda. E eu torcendo contra… E como era gostoso ganhar deles! Teve la o 5 a 1 de 1986, no mesmo ano teve a virada pela semifinal do Paulistão, também o 3 a 0 e, cara, como eu ficava contente! Queria eu ir lá zuar os caras, vê-los tristes e até conseguia. Até a página 2, porque eles já levantavam a cabeça, tocavam o bonde e diziam…

“Ser Corintiano é bom toda hora. Se não der agora, vai dar o ano que vem”

E seguiam lidamente apaixonados.

No meu íntimo de palmeirense eu pensava “Como deve ser bom sentir isso. Mas isso é coisa do corintiano, eu não sei como é e não quero saber!”. Ilusão, doce ilusão…

Caro amigo leitor que aqui me acompanha, vos digo; como palmeirense alucinado que sou bem conheço as coisas desse meu nobre rival. O time do Parque São Jorge é a maior representação popular de tudo que tem de mais brasileiro. Um time que agrega naturalmente brancos, pretos, amarelos, judeus, árabes, pobres, ricos, homens, mulheres, crianças, palestinos, azuis, amarelos… Que teve em sua administração ao longo de sua história, controvérsias, contestações e turbulências como em tudo que temos aqui no Brasil. Uma nação de 30 milhões de pessoas, um sentimento a parte ou como dizia Sócrates:

“Mais que um clube, o Corinthians é um estado de espírito”.

E bem mais…

O Corinthians é um pouco de tudo que há em nossas vidas. É a catarse que precede o prazer, é a gota d’água que explode em sentimento, é a lagrima que por vezes não escorre a face, para ficar guardada eternamente nos corações apaixonados de seus fiéis torcedores, é o sorriso no escuro onde só tem choro, é o contrario que pode acontecer é a hora que a razão pode não ser nada além de um capricho dispensável e tolo.

O Corinthians é a única chance que a paixão tem de ser para sempre.

Diante disso tudo, tenho certeza que nem seria necessário um título mundial para o amigo corintiano ser feliz. Porque ele é naturalmente feliz. Mesmo assim, Yokohama mereceu parabéns porque teve a honra de conhecer o Corinthians. Porque teve a chance de ver o paradoxo belo que há no fato de ter como herói, um centroavante rompedor peruano e um goleiro que defendeu até os pensamentos do time do Chelsea. Pois é amigo corintiano, em detrimento de tudo, dessa coisa aí do que se diz ser Anti, tu és campeão do Mundo e mais um monte de coisas…

Ontem foi teu 105º aniversário.

Vai amigo corintiano, vai para a festa em Itaquera porque você merece. Vai ser feliz e depois volta. Volta, porque o futebol seria muito chato sem você. Volta para a gente dizer que torce contra você Corinthians, que a gente não gosta de ver esse teu povo alvinegro feliz. E vou até te dizer que é verdade isso, mas por um viés que os cartesianos não vão saber explicar. Nossa diferença é que nos define Corinthians, nossa torta diferença.

Porque enquanto vocês odeiam nos amar, nós amamos odiar vocês…

 

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Um comentário em “Corinthians, Odeio Te Amar”

  • Laura Barboza disse:

    Que texto!
    Saudações alvinegros.
    Por incrível que pareça, eu como corinthiana que sou desde sempre (esse tal estado de espírito maravilhoso), gosto demais do Palmeiras pelo tanto de amigos queridos palmeirenses que tenho.
    Cartesianos não conseguem explicar uma coisa dessas. Ainda bem….

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