Por Victor Faria
I
O mito é o ser que é total.
O mesmo gol que abre os céus
É um mito brilhante e leal –
O corpo de um novo Deus,
Vivo e genial.
Este, que aqui jogou,
Foi aos poucos decidindo.
Seu existir nos bastou.
Assim foi prosseguindo
E nos guiou.
Assim a lenda se escreve
A entrar na eternidade,
E a fecundá-la se deve.
Em alta, em baixa, pela idade
Aos erros, releve.
II
Toda carreira é uma batalha.
O destino é o agente.
O herói defende, falha.
É inconsciente.
Às luvas em tuas mãos destinadas
Teu pesar cresce.
Que farei eu em bolas alçadas?
Ergueste-a, e fez-se.
III
O homem e a bola são um só
Quando a bola jaz e a história é feita.
O grito tarda, a garganta em nó.
A torcida espreita.
Mito, com louvor em seu Templo
Que Tricolor foi feito ser,
Que houveste a glória e deste o exemplo
De o defender.
Teu nome, eleito em grama,
É, na área de nossa glória,
O milagre, a fama,
O eterno em memória.
IV
Meu dever fez-me, como goleiro ao mundo.
A regra de ser guardador almou meu ser,
Em ofício escrupuloso e fundo.
Firme em minha convicção, tal vivi.
Cumpri contra o Destino o meu dever.
Inutilmente? Não, porque o cumpri.
V
Em seu lugar no caminho das esferas,
Com seu manto sagrado e puro,
Tem por seus pés um fato novo e as mortas eras –
O goleiro que tem, deveras,
A bola como porto seguro.
VI
Braços erguidos, bola na marca da cal.
Parece um martírio, um dado passo –
A tensão do jogo é natural
A intervenção que possa haver além do espaço.
Seu formidável vulto antigo
Precede a prece, promessas ao léu,
Não parece temer o inimigo.
Que ele erga os braços e alcance o céu.
VII
Outros haverão de ter
O que houvermos de perder.
Outros poderão ganhar
O que, em nosso pesar,
Parece um erro, um achado,
Segundo o destino dado.
Mas o que a eles não remete
É a Magia que se repete
Quando de longe ele mira a glória.
E por isso a sua história
É justa homenagem dada
Por uma nação conquistada.
VIII
Com uma das mãos – o Ato e o Destino –
Defendemos. No mesmo gesto, à altura,
A mão se ergue em movimento divino
E a bola afasta. Uma pintura!
Fosse a hora que haver o que deveria ser
A mão que o céu alcançou,
O gol não devemos temer.
À glória ele nos alçou.
Fosse acaso, vontade ou destino
A mão que ergueu o facho que luziu,
Foi Deus a alma e o corpo menino
Da mão que à taça nos conduziu.
IX
Ó campo sagrado, quanto de teu amor
São lágrimas do Tricolor!
Por ti torcemos, quantas mães pediram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantos gols ficaram por gritar
Para que pudéssemos, enfim, ganhar.
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer se tornar um vencedor
Tem que passar além da dor.
Homens ao campo, única sensação.
A luta que precede um ser campeão.
X
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece o talento que tem,
Mal sabe o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
O futuro é incerto e nebuloso.
Tudo se despede, nada prodigioso.
Ó Tricolor, hoje és lamurioso…
É a Hora! É o Adeus.