Sim, os estaduais são um dos problemas do futebol brasileiro. Talvez eles sejam o problema mais óbvio, aquele que menos faz sentido e por onde normalmente as mudanças devem começar. É evidente que alterar o funcionamento deles não vai resolver todos os nossos problemas, mas ao observar a situação do futebol brasileiro somos acometidos por um ímpeto de acabar com os estaduais. E aí é que começam os problemas.
A palavra não deveria ser “acabar”, mas sim “mudar” (ou “mudar de vez”).
Não resta dúvida que 23 datas é um descalabro com nosso calendário, que o torcedor não tem interesse nesses campeonatos com a fórmula atual e que eles se tornaram um encosto que assombra a todos enquanto alguns poucos espremem as últimas gotas que restam destes bagaços antes que a falta de sentido da qual sofrem terminem de matá-los. Mas é possível reduzir os estaduais a 8 ou 12 datas, fazer com que os grandes joguem sempre no interior e posicioná-los como uma passagem entre a pré-temporada e campeonatos mais competitivos. Não só é possível, como vale a pena.
Vale a pena porque os estaduais fazem parte da história do futebol brasileiro. Há confrontos com passado rico que nunca mais se repetiriam se eles acabassem, casos marcantes para jogadores e torcedores que só são possíveis num ambiente menos moderno e rígido e traços importantes do nosso futebol que vieram desses campeonatos. Como diz Matias Pinto, é importante para o caráter de nossos jogadores que todo ano eles se lembrem da realidade futebolística do interior de seus estados, é algo que só existe no Brasil.
Não acho que o fim dos estaduais prejudicaria em demasia a formação de novos jogadores (acredito que esse papel seria, se já não foi, facilmente substituído), mas os grandes tem uma dívida com esses campeonatos: não só por seus torcedores interioranos (que hoje torcem mais para o time da capital do que para o local), mas principalmente porque foi de lá que eles vieram, é lá que estão suas raízes. É como alguém que melhora de condição social e muda de bairro: ele pode continuar a visitar seus amigos de infância bebendo cerveja barata e salgadinhos de má qualidade de vez em quando ou ignorar seu passado e declarar-se bom demais praquele lugar.
Vale a pena salvar os estaduais para contrapor o deslumbramento que dinheiro, estádios novos e transmissões televisivas nos causam, vale a pena salvar os estaduais para preservar a história do futebol nacional, vale a pena salvar os estaduais porque eles são uma tradição importante do Brasil e são parte de nós. Devemos honrá-los e fazê-los serem o melhor possível, ao invés de individualisticamente nos declararmos superiores a eles.
E se você acha todo esses argumentos tradicionalistas, retrógrados, conservadores e ultrapassados demais eu te pergunto: qual seria a graça do futebol sem sua história e tradições?