Entro na home do portal Terra na madrugada, para dar início a uma pensata ligeira por aqui. Não poderia receber melhor oferta. A metade nobre, alta, da página é toda de uma propaganda de um relógio. Dia dos pais no lugar da notícia principal. Abaixo dela, na segunda fileira, a primeira útil, uma notícia sobre um evento falso no facebook que teria causado polêmica, um retângulo grande do Climatempo informando a temperatura na cidade e, por, fim, mais publicidade, agora de um programa social do Governo.
É um bom preparo para o assunto governista. Rolo a página para baixo e encontro 7 fotos nas unidades informativas seguintes. Cinco são de Dilma Roussef, todas sob e sobre crise, uma é de Collor, e a última é… Publicidade do Boticário. É suficiente.
O portal Terra, laranjinha na aba de cima como a Central 3, é dos sites mais importantes para a internet brasileira. Era provedora de internet, se chamava Zaz, e virou produtora de conteúdo com seus méritos e seus mistérios (Conto até hoje de quando acessei a home e estava sendo transmitido um jogo mexicano sub-18, Cruz Azul x Necaxa, no CT do primeiro, com todos os garotos usando camisa com números de 3 dígitos, sem narração, sem caracteres, sem explicação. Foi 1×1).
Hoje, na prática, a Terra deu três tapas no tatame. Pediu água. Passou o cadeado na redação, abriu o jogo para o público, posicionou-se, apesar dos eufemismos, como um portal dedicado a reproduzir conteúdo de parceiros e terceiros ao invés de material original de sua equipe, agora diluída, finda para este fim.
Nunca fui o maior fã do Terra. Não sou especialista em mercado da comunicação moderna. Mas tenho colegas e amigos que lá dentro trabalharam e trabalhavam. Nunca estive em um jornalão, sitezão ou coisa do tipo. Minha casa é a Central 3, onde você lê este quase-nada aqui.
Há quem sentencie a morte disso e daquilo. O jornal impresso acabou, o furo morreu, a fonte já era, estas coisas. Eu costumo, em noites mais boêmias, sentenciar a minha própria finitude. Não vou dar em nada, vou acabar fazendo obituário de jornal de bairro, agora rasgo o diploma e viro carteiro, estas coisas. O amigo que visita a Central 3 e chega até esta linha pode não se perguntar, mas pergunte-se o impacto, se é que há, de um 6 de agosto em que o Terra fecha sua redação, na vida da redação da Central 3.
Eu te respondo que não causa nenhum impacto, mas é mentira. A areia debaixo do mar está sempre em movimento. Às vezes não dá pé. O Rodrigo Borges, jornalista parceiro da Central 3 pelo podcast Esporte Final, lançou o site Bikpek, ideia saborosa sobre esportes olímpicos que precisa de empurrão econômico para começar saudável. Este é só um de vários exemplos (jogue Puntero Izquierdo no Google) pingando aqui e ali para quem está atento. São as ondas. E não são sós.
Pra não sair da C3, o Paulo traz pauta sobre literatura toda semana. O Filipe dá aula de política internacional às sextas, o Gabriel cava os entrevistados mais viscerais das lutas sociais do Brasil, o Matias lidera o que mais bacana conheço sobre cultura latina em português, e eu acho que tudo isso deveria caber nos grandes portais do Brasil. E cabe. Em tese, claro. Quem resistir, enquanto resistir, será a maré. O mar é vasto. Em tempos de internet livríssima, ele é muito mais água do que podemos ver ou beber.
Vai ver neste mar as baleias, gigantes e fortes, encalham, e os pequenos siris nadam para todo lado sem muita comida. Nem um nem outro está feliz. A liberdade do conceito, do formato, da facilidade na publicação, não faz frente à falta de liberdade editorial, econômica, burocrática, ou à falta de imaginação pura e simples. Mas aí já sou eu dando uma de analista de mercado, e prometi não fazer. Este é só um obituário que eu me permito escrever enquanto não viro carteiro.
Enfim. Outras redações fecharão. Algumas seguirão mortas-vivas. E a Central 3 está aqui. É pouco, mas não tem propaganda de relógio na lata do meio da home em dia de 30 demissões. Bem-vindo, volte sempre e fale conosco.