Por Leonardo Soares dos Santos*
Qualquer cidade que tivesse mais de 400 mil habitantes e sediasse importantes empreendimentos econômicos, como exploração de petróleo, atividades agrícolas e ampla gama de estabelecimentos voltados ao comércio e setor de serviços, além de uma importância estratégica em âmbito regional, saberia explorar todo esse potencial de modo a incrementar o cenário esportivo do lugar, em especial aquele relacionado ao futebol.
E ainda mais uma cidade possuidora de tanta tradição em termos de futebol, com um passado tão rico, onde desfilaram vários times marcantes, verdadeiras instituições locais.
E mesmo assim, com um passado tão vibrante, o futebol declina cada vez mais nas terras dos Campos dos Goytacazes.
Trata-se de uma tragédia, de algo verdadeiramente indecente, constatarmos o que conseguiram fazer com o esporte – absolutamente sucateado, combalido, no chão.
Praças esportivas, os estádios, cada dia mais decrépitos, corroídos pelo tempo. Clubes sepultados como o Vesúvio, Rio Branco e Municipal.
Os “grandes de outrora”, como Americano e Goytacaz, mal conseguem participar de partidas fora de Campos. E ano após ano declinam dos convites para participar da Copa Rio, no segundo semestre.
O heroico Campos subiu duas divisões recentemente, com uma estrutura montada exclusivamente em razão do esforço abnegado e desinteressado de uns poucos apaixonados pelo clube, e figurará na elite do campeonato “organizado” por Rubens Lopes.
Nas últimas décadas, só o Americano botou a “cara para fora”. E mesmo assim muito por conta de Eduardo Viana, o famigerado “Caixa d’Água”, que reinou durante décadas na FERJ. Com esse notório torcedor do clube, o Mosqueteiro, coincidentemente, pode usufruir de arbitragens distraídas em fazer justiça aos times adversários.
E estamos falando, o que é o principal, de uma cidade de uma intensa e pujante história relacionada ao futebol operário.
Foram vários os chamados “times de usina”, as equipes formadas por ou com funcionários das usinas açucareiras: São João, São José, Cambaíba, Sapucaia, Aliança (Usina do Queimado) e Cruzeiro (Usina de Poço Gordo). A maior parte surgiu entre os anos 1940 e 1950, o que coincide mais ou menos com o auge da economia açucareira moderna.
Tratava-se de times que, mesmo patrocinados por um ou outro usineiro, eram todos organizados pelos operários, não apenas aqueles que trabalhavam no interior das usinas, como os trabalhadores que atuavam diretamente nas lavouras de cana-de-açúcar.
Essas equipes desempenhavam papel importantíssimo como fator de sociabilidade entre esses trabalhadores. Os jogos eram realizados geralmente aos domingos. Mas o jogo era apenas um detalhe: havia os treinos após o expediente (normalmente a partir das seis da noite), as viagens aos campos dos times adversários, o churrasco pós-jogo.
Há toda uma gama de experiências, emoções, expectativas e narrativas sobre esse incrível aspecto da vida social de Campos que ainda precisa ser devidamente estudada. A sua população, a sua juventude, em especial, pouco sabe desse notável passado. Uma pena.
Importante que se destaque: os times de usinas não protagonizaram proezas apenas no campo do amadorismo. Alguns deles obtiveram ao longo de décadas várias conquistas no plano do futebol profissional.
O Aliança, por exemplo, obteve o tricampeonato campista de futebol, nos anos de 36-37-38. E ainda abocanharia o campeonato fluminense em 1936.
O São José, inclusive, acabou sendo o primeiro campeão da “Era profissional” de Campos dos Goytacazes, em 1952.
E décadas depois assistiríamos ao Sapucaia conquistar o campeonato estadual do Rio de Janeiro em 1974 – torneio disputado entre os clubes do estado, porém, sem a presença dos clubes do antigo estado da Guanabara (atual capital), que se fundiria definitivamente ao Rio em 1975. Já os campeonatos, seriam fundidos em 1978 – em outra façanha de um time de usina.
*professor de História na UFF (Campos dos Goytacazes); convidado do Conexão Sudaca #70, a respeito da sua pesquisa sobre times operários na Argentina e Uruguai
Paulinho disse:
Minha Campos te amos demais,
Por isso sou torcedor do Goytacaz……………
Paulinho disse:
Sou de Campos,morei muitos anos em Cambaíba,sede de um dos times citados acima,e digo que realmente o futebol campista em geral,tanto amador como o “profissional” está em estado lastimável!