No final de julho é celebrado o Dia do Amigo em várias partes do Mundo, por conta da chegada do homem à Lua em 1969. No plano terreno, vamos visitar algumas das principais amizades forjadas nas arquibancadas passando por Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Grécia, Holanda, Israel, Itália, Peru, Reino Unido, Sérvia e Uruguai!
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Os tiros de Porta Nuova
A violência no futebol italiano e mundial é bem mais antiga do que se imagina. Os primeiros casos de brigas entre torcedores foram relatados na véspera da primeira guerra mundial. Foi no período da subida ao poder do fascismo que a velha bota conheceu sua primeira onda de violência, entre 1919 e 1925. Árbitros e jogadores agredidos, ônibus apedrejados, agressões físicas e verbais. Relatórios recentes dos arquivos do ministério do interior italiano, das delegacias de policia e da imprensa comprovam a existência precoce deste fenômeno principalmente na Itália central e setentrional. A final do campeonato da Itália do norte entre Bolonha e Genoa é um famoso exemplo disso.
Nos meses de junho e julho de 1925, a final do campeonato italiano do norte fora realizada por diversos jogos disputados entre Bolonha e Genoa. A tensão esteve no auge depois de uma longa e cansativa temporada. A primeira final disputada em Milão foi o palco de várias irregularidades. O Bolonha perdia por 2 a 1 e conseguiu o empate de maneira bem pitoresca, digamos assim. A bola saiu pela linha de fundo do ataque do time bolonhês quando de repente a torcida sentada na beira do campo pegou a bola e passou para Bellini que assim marcou o gol salvador. O árbitro Mauro invalidou o lance no primeiro momento, mas ao perceber a fúria dos tifosi na beira do gramado resolveu revalidar o gol. Segundo o jornal La Stampa do dia 9 de junho de 1925: “Mauro tentou sair de campo, mas decidiu ficar e depois de 13 minutos de discussão acabou validando o gol”. Revoltados com o lance, os dirigentes e jogadores do Genoa decidiram abandonar o campo.
Não precisaria nem ressaltar que os jogos seguintes foram disputados em um clima bem pesado. Deste modo, na véspera do jogo disputado em Turim, na cancha da Juventus localizada em Corso Marsiglia, o jornal Paese Sportivo anunciou que “por determinação das autoridades não seria permitida a entrada de pessoas munidas de bastões.” No dia seguinte da peleja, o mesmo jornal publicou que todas as precauções foram tomadas para que o jogo fosse realizado na mais perfeita calma. “Em volta do retângulo de jogo, um cordão de isolamento foi formado por Carabinieri, um militar a cada três metros”. Ao que tudo indica o resultado foi satisfatório já que o jogo terminou numa boa, ainda com um empate de 1 a 1.
No entanto, a tensão ficou para o lado de fora do estádio. Na estação de trem de Turim. O jornal Paese Sportivo, no dia 6 de julho de 1925, publicou: “Na estação de Porta Nuova, vários incidentes ocorreram durante a partida de dois trens. Torcedores do Genoa e Bolonha brigaram dentro da estação. Tiros foram disparados de dentro do trem que saia para Bolonha às 20h40. Há relatos que um torcedor genovês fora atingido”. O Gazzetta del Popolo publicou no dia 6 de julho de 1925 que os meliantes abriram fogo quando o trem saia da estação e que a maioria dos disparos foram para o alto, porém alguns tiros atingiram o trem da torcida adversária. Uma pessoa ficou ferida, foi um estivador do porto de Genova, Francesco Tentorio, alvejado na perna esquerda.
Os comentários de uma imprensa controlada pela censura desde o estabelecimento da ditadura fascista em 1925 mostram que longe de ser um fenômeno isolado, os tiros da estação de Porta Nuova eram a expressão máxima da paixão futebolística. Os comentaristas da época não se espantaram com o episódio já que era factível um incidente por causa das condições impostas aos torcedores. As discussões entre torcidas rivais pareciam aos olhos dos jornalistas um elemento natural do espetáculo esportivo. Quando o jogo terminava, as provocações continuavam na saída dando ensejo a algumas brigas. Segundo os jornalistas, os torcedores faziam de tudo para ajudar o time utilizando todos os meios possíveis e imaginários. Outros responsabilizaram os clubes por contratar trens privados para o transporte de 500 a 1000 torcedores a cada jogo. O objetivo era mostrar a força de sua torcida no campo adversário como assim relatou o Gazzetta del Popolo: “Só os times não parecem ser o suficiente, é preciso a presença dos torcedores com o objetivo de colocar os rivais anfitriões em posição de inferioridade e preparar um ambiente propicio à vitória” .
Pode-se comparar algumas repreensões como aquelas cometidas contra os inimigos do fascismo. A FICG puniu o clube bolonhês com uma multa pesada de 5 000 liras por não divulgar a lista dos torcedores culpados do incidente de Porta Nuova. Um agrupamento formado por torcedores reuniu mais de 1 000 pessoas na Piazza Nettuno, no coração de Bolonha. Organizada por um conselheiro municipal, o capitão Galliano, a manifestação tinha por objetivo apoiar o clube que havia negado a deliberação estatal. Apesar da ocupação da praça, o clube foi obrigado a ceder. O estado fascista estabeleceu uma legislação especifica para os encontros esportivos. O decreto-lei de 6 de agosto de 1926 instituiu a obrigação da dupla autorização, prefeitura e governo, para a realização de um jogo internacional (artigo 1) e os jogos nacionais deveriam ser realizados após a aprovação do prefeito ao menos um mês antes (artigo 5). Tais medidas não foram suficientes para sufocar o espírito do tifosi, mas a febre futebolística do pós-guerra estava sob controle.