*Por Luiz Thunderbird
O ano era 1990 e o povo brasileiro havia sido assaltado pelo governo Collor; as economias familiares tiveram suas poupanças varridas pela ministra Zélia Cardoso de Mello. O clima era sinistro, lembro bem. Eu mesmo tive um prejuízo razoável, visto que estava prestes a assinar um contrato com uma gravadora, para o lançamento do primeiro disco da minha banda. Eu e outros artistas, tivemos nossos planos alterados devido a crise que se abateu sobre a nação.
Mas aquele ano nos reservava umas boas surpresas: A estréia de Twin Peaks, a série revolucionária dirigida por David Lynch, e a inauguração da MTV no Brasil.
https://www.youtube.com/watch?v=19wLZuIWB7M
Twin Peaks aconteceu porque a rede de televisão americana ABC precisava mudar a cara da sua grade de programação. David Lynch já havia mostrado seu potencial e estranheza com os filmes Eraserhead, Duna e Blue Velvet. Ele e o amigo Mark Frost (cocriador e produtor executivo da série), decidiram topar o desafio de mudar o rumo da TV aberta americana.
No Brasil, a MTV fez o mesmo papel, mudando o cenário da TV aberta por aqui.
No primeiro ano, os VJs helicóptero deixavam a juventude excitada e os velhinhos tontos.
As novas caras ganharam a simpatia da audiência, com aqueles fundos eletrônicos produzidos pelo chroma-key, as novidades musicais em forma de videoclipe e o jeito descontraído de fazer televisão. Havia muita liberdade pros apresentadores e produtores dos programas.
Cuca, um helicóptero adorável…
Liberdade semelhante a que foi dada a David Lynch de produzir uma série cheia de estranhezas, com personagens bizarros e improvisações improváveis (muito eu mesmo, na MTV).
Em Twin Peaks muita coisa aconteceu ao acaso. Um dos personagens mais emblemáticos, o assassino Bob, surgiu de um erro de filmagem. O decorador de cenários Frank Silva “vazou” na imagem de uma das cenas. Ao perceber o fato, na edição, Lynch teve a ideia de assumir o erro e criar o tal personagem. Ele não só sobreviveu às 2 primeiras temporadas, como é personagem central da nova.
O grande problema de Twin Peaks surgiu quando a ABC passou a exigir a revelação de quem era o assassino de Laura Palmer, a rainha do baile, cerne de toda a trama. O investigador do FBI Dale Cooper era o personagem principal, mas o mistério que envolvia a morte da jovem era o combustível principal. As pressões foram tantas, que os roteiristas foram obrigados a escolher um final pro mistério.
A escolha foi feita pelo próprio Lynch e, pra não vazar a revelação, ele fizeram 3 versões diferentes com 3 assassinos. Até a edição do tal episódio, ninguém sabia. Coisas de David Lynch!
Michael Otken, ator que faz o papel do xerife Harry S. Truman, diz que a feitiçaria de Lynch é sutil, fácil, refinada e cheia de diversão. Isso é tudo que se espera de um diretor genial.
Lendo um livro sobre a série, Reflexions: An Oral History of Twin Peaks, de Brad Dukes, fiquei sabendo que Lynch se afastou da supervisão das filmagens da segunda temporada.
Vários diretores se revezavam a cada episódio, inclusive Diane Keaton. A coisa degringolou ainda mais com as mudanças no dia de exibição. Estava claro que a ABC não queria levar a série adiante. Assim como a Abril não queria mais cuidar da MTV no Brasil.
O fim era certo e a série ficou fora do ar até esse ano, quando Lynch e Frost se juntaram novamente pra surpreender a todos com a terceira temporada.
O fim da MTV Brasil ( que, de agora em diante, chamarei de Aquela MTV, pois a MTV Brasil ainda existe), também era inevitável. Só que nós, VJs, não sabíamos disso.
Eu voltei pela quarta vez pra emissora, pois a MTV Brasil queria recuperar o M de MTV. E nessa última fase, tivemos vários VJs falando de música. Mas em 2013 o sonho acabou. Eu estava lá desde o primeiro dia até seu último suspiro. Foi tudo muito bonito, muito bom, deixou saudades.
A pergunta em Twin Peaks era “Quem matou Laura Palmer?”
A pergunta na MTV era “Quem matou o videoclipe?”
Todos que trabalharam em Twin Peaks adoravam estar na série.
Trabalhar n’Aquela MTV era uma delícia. Até hoje eu ouço as pessoas dizerem que era um sonho trabalhar na MTV.
A novidade é que temos Twin Peaks de volta.
https://www.youtube.com/watch?v=QkXMnOLrN4M
A nova temporada terá 18 episódios, 8 deles já disponíveis na Netflix.
Estou adorando e não estou sozinho nessa. A cada episódio, troco mensagens com amigos sobre isso.
Edgard Scandurra é um desses fanáticos. E a gente fica nessa:
— Cara, vc viu aquela explosão? O que foi aquilo?
— Pura arte, meu amigo!
Sim, uma sequência impressionante da primeira explosão nuclear nos EUA…
David Lynch tem uma banda, ele adora música, ele cuida pessoalmente dessa área na série. Angelo Badalamenti é o autor do tema de abertura e outros temas incidentais desde sua estréia. Mas, nessa nova temporada, Lynch coloca bandas incríveis nos episódios. Dentre essas bandas, tem Nine Inch Nails!
Aquela MTV não sei se volta, mas em breve estarei no Youtube com meu programa Music Thunder Vision. Falarei de música, obviamente!
Recomendo muito assistir Twin Peaks e assinar meu canal no Youtube.
Falar de música é essencial pra mim!
Music Thunder Vision não será Aquela MTV, mas fará menções a ela e Twin Peaks, eventualmente.
Portanto, te vejo no MTV!
*Luiz Thunderbird é músico, apresentador de TV e comando o Thunder Rádio Show na Central3
Jonnata Doll disse:
Excelente texto Thunder, muita saudade da Mtv também!
Mateus disse:
Ótimo texto Thunder, gostei muito. Tenho muita saudade d’Aquela MTV, lembro de todas as fases do canal, acompanhei muito o canal, saudade de todos os VJs. Estou muito ansioso para ver o Music Thunder Vision, aliás se precisar de colaboração pode contar comigo. Tenho um blog / site, o Camaleão Rock e sempre falo sobre Rock, Metal e sobre Aquela MTV nele. Adoraria participar deste seu novo projeto, o MTV. Sou muito seu fã, como VJ e como músico, Thunderbird e os Devotos de Nossa Senhora Aparecida, Júpiter Maçã e Tarântulas e Tarantinos. Vai ser muito legal rever as histórias sobre Aquela MTV no seu canal com muito ROCK. Parabéns por não deixar o ROCK morrer no Brasil e manter viva as lembranças da saudosa MTV BRASIL.
Felipe Henrique da Silva disse:
Fala grande Thunder!
Confesso que à época não acompanhei muito a MTV, muito em conta de não contar com antena parabólica e não ter acesso ao canal.
Porém, com o advento da internet e todo o acervo que passou a ser disponibilizado, por meios oficiais e até mesmo dos entusiastas do “Hermes e Renato” (que valem o comentário, haja vista a grande quantidade de canais no Youtube com materiais do grupo de humor, alguns deles até aparentam possuir curadoria do acervo), confesso que sinto a nostalgia de uma coisa que não participei aquele momento, porém, entendo o valor de tudo que era produzido – e a importância da MTV para a cultura musical de sua época.
Embora, não apreciador do material produzido pela atual MTV, não caio no ódio irrestrito, pois, entendo que o entretenimento tem a face de sua contemporaneidade, leve-se em conta as principais discussões e apetrechos bastante monitezivaeis e tem-se o “mojo” da MTV vigente.
Entendo que o material da MTV da nostalgia, vivida ou não, migrou para os ramos menos formais, mas não menos importantes, do entretenimento, como plataformas de vídeo (Youtube e vimeo, p.ex.), sendo basicamente do compromisso financeiro da produção, com foco no aspecto estético do produto.
Com tantas repetições de entretenimento, fez-se, quase menção (in)direta à Graça Infinita e toda a plenitude daquilo, psicodélico ou feroz, que a MTV de outrora foi, aquela da qual sentimos falta. Não sei explicar, mas vejo na figura do João Gordo, e inclusive em vossa, Thunderbird, uma espécie de personificação daquela MTV.